80% das pessoas sente-se pressionada para ser produtiva e desincentivada a ser criativa no local de trabalho, segundo um estudo da empresa multinacional fabricante de software informático Adobe. Na vida real, se pensar nisso, não difere muito. Passa mais tempo a procurar solucionar problemas e resolver assuntos do dia a dia do que a desenvolver atividades criativas.

Uma realidade que Anita Silva, CEO da empresa de consultoria criativa Team Mais e co-fundadora da Clown Care, uma associação que leva a arte do palhaço a lares de idosos, procura combater. «A primeira coisa que faço quando quero ser criativa é deixar a questão em banho-maria», revela a especialista, habituada a lidar com o problema, em entrevista à Prevenir.

«Isto faz com que o consciente deixe de estar tão ativo a procurar uma solução lógica e o inconsciente possa começar a intervir, como acontece nos sonhos ou quando passamos à frente da resposta mais difícil no teste e voltamos a ela mais tarde, já com outros estímulos na cabeça. Quando volto à questão, surgem invariavelmente novas ideias. Depois, crio momentos de pensamento divergente. Juntar universos distintos é um exercício que ajuda», refere.

«Se estou a criar uma formação de criatividade, posso pensar como é que juntaria o mundo do ballet a esta ideia ou outra coisa que venha de um mundo diferente. Isso ajuda a desformatar o cérebro. Também uso mapas mentais ou esquemas em papel para visualizar ideias. Tenho um elemento no centro e vou juntando outros em volta», diz.

«Isso ajuda-me a ter uma visão global e a combinar elementos de formas inesperadas», acrescenta ainda Anita Silva. Estes são os conselhos que os especialistas que contactámos deixam para reforçar a criatividade, uma atividade que estimula e melhora a atividade cerebral, no seu dia a dia:

Desligue a autocensura

«Faço um exercício matinal que se chama morning pages. Consiste em fazer escrita automática, sem censura, logo de manhã, ainda meio a dormir. No início custa, podem só sair coisas como não me ocorre nada ou está sol. Mas, se continuarmos, começam a surgir coisas interessantes e é uma prática que ajuda a desligar o modo lógico e a autocensura», diz Anita Silva.

Recorra a jogos

«Recorro a jogos de encaixar peças enquanto escrevo», revela Margarida Fonseca Santos, escritora que dá cursos de escrita criativa e formação a professores na Associação Educativa para o Desenvolvimento da Criatividade. «Há um truque que uso quase todos os dias. Ligo um jogo simples de encaixar peças por cima do documento em que estou a trabalhar», começa por revelar.

«Ao jogar desta forma, o cérebro descontrai. E esse é o segredo para sermos bem-sucedidos. Descontrai e começa a associar livremente ideias, frases, cenas já pensadas. Quando sinto que estou nesse ponto, desligo o jogo e escrevo. Muitas vezes, as ideias surgem-me por associação», prossegue.

«Uma frase que me transporta para um cenário ou que sugere uma cena», exemplifica. «Isto acontece no meio de tarefas como lavar loiça, arrumar, guiar numa autoestrada ou meditar. Mais tarde, de forma às vezes rudimentar, outras elaborada, faço um esquema com um lápis. Só depois escrevo. Posteriormente, começa o verdadeiro trabalho, que é rever, modificar, voltar atrás…», diz.

Arranje um hobby

«Os hobbies são estimulantes e, como o cérebro tende a generalizar (tanto as boas como as más práticas), dão-nos maior capacidade de ser mais criativos, seja na nossa profissão ou na forma como aproveitamos a reforma» refere Margarida Fonseca Santos.

Passeie e visite espaços museológicos e culturais

«Inspiro-me tanto em museus como no YouTube», revela Pedro Tochas. O comediante, especialista em stand up comedy, faz também palestras motivacionais em empresas. Quando lhe dizem «Ah! Tudo o que dizes tem piada», reage de imediato. «Eu respondo que aquilo é o que vês depois de eu andar semanas a trabalhar nisso. Há que escavar muito, ter muitas ideias até aparecer uma pepita», sublinha.

«Uma das coisas que mais me estimula é ver museus de arte contemporânea, também viajo muito e vejo muitos espetáculos, mas até a navegar no YouTube temos informação estimulante», refere. «Começa-se por um vídeo que nos mandaram e acaba-se a ver algo sobre a reprodução de pandas. O mundo está cheio de coisas incríveis», afirma Pedro Tochas.

«Quando tenho um espetáculo para preparar, passo algum tempo a recolher material. Se algo me chama a atenção durante o jogging, anoto no telefone ou aponto em casa. Depois, decido um tema e vou pensando naquilo durante semanas, tendo ideias, sem me preocupar se são boas», revela o humorista.

«Fazer a primeira versão é o que requer mais coragem. O escritor Ernest Hemingway dizia que o primeiro rascunho é, com certeza, uma porcaria. Não podemos ter medo disso. Eu apresento as ideias mesmo inacabadas para ter feedback e vou melhorando o material a partir daí», esclarece Pedro Tochas.

Exerça a capacidade de deslumbramento

«O mundo é como um museu de arte contemporânea, tem coisas que não lembram ao diabo. Para criar, tenho de estar permanentemente aberto, como uma esponja, a absorver estímulos de fora. Isto ocorre 24 horas por dia. É uma forma de estar curiosa e atenta. Como comediante, o meu material é o mundo e o combustível das ideias é a vida», diz Pedro Tochas.

 

17.09.2018
Fonte: lifestyle.sapo.pt